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Notícia

Cientistas da Unesp utilizam resíduos de sisal para produzir shampoo mais seguro

24/01/2022
Inovação de baixo custo e renovável pode dar novo destino a toneladas de partes da planta que são descartadas todos os anos e ajudar famílias que dependem dela para sobreviver
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Novo produto possui propriedades naturais que apresentam grande poder de limpeza. Foto: Lucineia dos Santos 

Um novo shampoo feito com resíduos de sisal – planta encontrada em abundância no Nordeste brasileiro, pode revolucionar a indústria farmacêutica e de cosméticos. Preparado com uma substância natural encontrada no vegetal, o produto promete ser uma opção aos cosméticos comercializados atualmente que, em sua maioria, são produzidos com compostos químicos que podem causar irritações, além de retirar propriedades importantes da pele. O novo shampoo desenvolvido por pesquisadores da Unesp, em Assis (SP), também oferece um destino nobre a toneladas de restos de sisal que anualmente são descartadas após as fibras da planta serem aproveitadas para outras finalidades. Com isso, a inovação de baixo custo e renovável é capaz de gerar impactos positivos na economia e tirar da pobreza populações vulneráveis que dependem da planta para sobreviver, tudo isso de forma sustentável.  

 

A professora Lucineia dos Santos, docente da Unesp e uma das responsáveis pela produção do novo shampoo, explica que a fibra representa apenas 5% do peso total da planta, sendo que o restante vai para o lixo. “A indústria e os cientistas têm buscado outros destinos para esta fibra, pois são muitas toneladas produzidas por ano e todo o resíduo é descartado. É um custo elevado para se aproveitar muito pouco da planta. Além disso, a fibra do sisal está perdendo mercado para fibras sintéticas, que são mais baratas”, explica. 

 

Utilizando o resíduo da planta, os pesquisadores da Unesp realizaram vários estudos e comprovaram que o material que seria jogado fora é rico em saponinas, compostos químicos presentes nas folhas do sisal com grande poder de limpeza. “A partir do resíduo do sisal é possível obter moléculas naturais tensoativas que são capazes de produzir espuma e limpar. Na maioria dos sabonetes e shampoos usados atualmente há uma substância sintética chamada Lauril Sulfato de Sódio, responsável por promover a espuma do produto. Apesar de limpar e ter um baixíssimo custo, esse composto pode causar vários problemas para a pele, como irritações, já que não retira apenas o óleo em excesso, mas também as gorduras que são consideradas boas e outras substâncias importantes”, relata a professora. O novo produto desenvolvido na Unesp tem espuma suave, macia, não agride o couro cabeludo, não danifica e nem resseca os fios. 

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Com espuma suave e macia, shampoo desenvolvido na Unesp não agride o couro cabeludo e nem danifica os fios. Foto: Lucineia dos Santos

Estudos recentes realizados pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos revelou que o sangue humano e os tecidos lipídicos contêm até 400 substâncias químicas perigosas originárias de medicamentos, cosméticos e produtos alimentícios, que podem causar vários tipos de câncer e diversos distúrbios crônicos. Diante dessa realidade em todo o mundo, inúmeras pesquisas têm buscado a substituição dessas substâncias por compostos de origem natural. “Até o momento, nenhuma das formulações tensoativas disponíveis no mercado, particularmente aquelas consideradas essenciais, como as de sabonetes e shampoos, apresenta uma composição 100% natural, por isso a importância de buscar por novos tensoativos naturais que possam substituir os sintéticos nas formulações dos mais variados produtos farmacêuticos e cosméticos, evitando danos à pele e ao couro cabeludo”, afirma Lucineia. 

 

Potencial inexplorado - Com folhas que podem chegar a um metro de comprimento, o sisal é muito encontrado na Bahia, maior produtora e exportadora do mundo da fibra obtida da planta. 95,2% da produção nacional -  que representa 42% do total produzido no planeta - está no Estado. Em 2019 (último dado disponível), foram produzidas 206,5 mil toneladas de fibras de sisal, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura. Originário do México, mas muito bem adaptado ao clima semiárido do país, onde geralmente chove apenas uma vez por ano, o sisal é o sustento de centenas de famílias que retiram a fibra do vegetal e revendem para as indústrias automobilísticas e da moda, fábricas de tapetes e produtores de artesanato. 

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Sisal é encontrada em abundância no Nordeste brasileiro. Foto: Canva

Segundo Lucineia, é possível valorizar algo que iria para o lixo e ajudar milhares de pessoas que vivem da produção do sisal reaproveitando o resíduo, promovendo sustentabilidade e garantindo melhorias econômicas e sociais. “Eu já estive na Bahia algumas vezes, na região conhecida como sisaleira. É uma das localidades mais pobres do país e de muita seca. As pessoas trabalham em condições totalmente precárias, muitos perdem dedos na hora da retirada das fibras, pois não usam equipamentos de proteção individual. É uma população que dificilmente recebe por mês um salário mínimo. Precisamos aproveitar o que está sendo jogado no lixo não apenas por uma questão de sustentabilidade, mas principalmente para dar mais qualidade de vida para as pessoas que vivem dessa produção” alerta. 

 

A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza a importância de se aproveitar o resíduo para melhorar as condições de vida das pessoas, mas no Brasil isso ainda é muito pouco explorado e são poucos os estudos desenvolvidos. Na visão da professora da Unesp, é um grande desafio que agora pode ser superado. “Com a inovação, podemos resolver diferentes problemas ao mesmo tempo. Os próprios produtores familiares poderiam estabelecer uma logística, recolher esse resíduo em alguma central de coleta e abastecimento e enviar para o local onde as saponinas poderiam ser extraídas e distribuídas para qualquer tipo de fábrica”, afirma.

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Inovação de baixo custo e renovável é capaz de gerar impactos positivos na economia e tirar da pobreza populações vulneráveis que dependem da planta para sobreviver. Foto: Lucineia dos Santos

Durante o desenvolvimento do novo shampoo de sisal, diversos testes foram realizados em laboratório para avaliar, dentre outros aspectos, seu grau de segurança com relação às substâncias tóxicas, além parâmetros relacionados ao pH do material, à viscosidade, ao odor e à cor do cosmético. O produto já foi patenteado pela Agência Unesp de Inovação (AUIN), e artigos estão sendo finalizados para publicação em revistas científicas. Os pesquisadores buscam agora parceiros para realização de testes em humanos. “É uma solução simples que pode revolucionar uma cadeia de problemas. Além disso, outras funções podem ser atribuídas a essa nova solução tensoativa natural. Nós precisamos construir uma ponte entre a academia, o poder público e a sociedade. Os cientistas trabalham buscando o bem-estar da população e é preciso valorizar isso. O Brasil tem uma biodiversidade tão rica e podemos fazer muito mais com que já existe aí”, conclui a especialista.

 

Sobre a AUIN - A Agência Unesp de Inovação realiza estudos de viabilidade das invenções dos pesquisadores da Universidade, atua na proteção do patrimônio intelectual e nos trâmites necessários para gestão de patentes. Assim, o órgão é responsável por negociar parcerias e transferir tecnologia da universidade para os setores empresariais e sociais por meio de licenciamentos. 

 

A AUIN também incentiva e apoia o empreendedorismo universitário, estimulando a criação de novos os negócios, empresas filhas, startups e spin-offs, além de produtos, serviços e soluções que em seu processo de construção e execução possam beneficiar tanto a Unesp como a sociedade. Se você deseja comunicar sua invenção e solicitar um pedido de patente, bem como conhecer todos os detalhes sobre o trabalho da Agência, acesse o site da entidade clicando neste link.


Por Eduardo Sotto Mayor, da Fontes Comunicação Científica, para a AUIN

 

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